ENZIMAS: TRABALHO CIENTÍFICO [1]

Substâncias

 

 

INTRODUÇÃO A descoberta das enzimas data do século XVIII, quando se iniciaram os estudos sobre digestão dos alimentos

. No século XIX, Pasteur afirmou que a fermentação era inseparável da célula viva e estabeleceu o conceito de que as enzimas eram células vivas. Na mesma época, Liebig afirmava que a fermentação era provocada por substâncias químicas
A denominação enzima (do grego: “em leveduras”) foi dada por Khune em 1878. Em seguida, Buchner acabou com a controvérsia entre Liebig e Pasteur, ao mostrar a possibilidade da fermentação na ausência de células vivas. Os trabalhos de purificação de enzimas começaram depois de 19201-9. Toda enzima possui um centro ativo, local onde se processam as reações com determinados substratos. Esse centro ativo é geralmente constituído de alguns resíduos de aminoácidos da cadeia de proteína e um grupo não-proteico, sendo responsável pela atividade biológica da enzima. Algumas enzimas dependem somente da sua própria estrutura proteica (apoenzima) para exercer sua atividade, enquanto outras necessitam também de um ou mais componentes não-proteicos chamados de cofatores, que podem ser íons metálicos ou moléculas orgânicas denominadas de coenzimas. Muitas enzimas dependem de ambos. Outras enzimas possuem um grupo prostético que é similar ao cofator, mas está firmemente ligado à apoenzima. O complexo cataliticamente ativo enzima-cofator é denominado de haloenzima. Enzimas são portanto, na sua grande maioria proteínas que catalisam com grande eficiência as reações biológicas. Essas aceleram várias reações metabólicas importantes para a vida sob condições fisiológicas de pH, temperatura, meio iônico etc. As reações catalisadas por enzimas há muito tempo vêm sendo usadas com diferentes propósitos como a determinação de atividades enzimáticas, inibidores entre outros. Em virtude de sua alta seletividade (em alguns casos especificidade) e poder catalítico, as enzimas vêm sendo muito empregadas em química analítica, bem como na medicina, agricultura, tecnologia de alimentos e estudos ambientais. O emprego de enzimas purificadas em química analítica pode ser encontrado em excelentes monografias estrangeiras  ou nacionais. No entanto, há uma carência de monografias de circulação internacional devotadas à utilização de tecidos e/ou extratos vegetais em química analítica e nenhuma na língua portuguesa, tornando assim o presente trabalho de divulgação de extrema importância para as pessoas que trabalham nas áreas mencionadas, além daqueles profissionais que atuam em áreas correlatas. O Brasil tem uma grande variedade de vegetais que podem constituir em fontes inesgotáveis de enzimas para serem aplicados nas mais diversas áreas do conhecimento. Em química analítica, por exemplo, eles podem ser usados na construção de diversos tipos de biossensores e/ou procedimentos enzimáticos de análise. Há uma tendência recente de utilização de tecidos de vegetais e/ou extratos brutos no lugar de enzimas purificadas na confecção de biossensores e/ou procedimentos enzimáticos de análise. O uso de extratos brutos e/ou tecidos vegetais pode apresentar em alguns casos, certa desvantagem na seletividade do método analítico, mas por outro lado são extremamente econômicos e geralmente possuem tempo de vida superior àqueles métodos que utilizam enzimas purificadas, visto que estas enzimas naturalmente imobilizadas nas células destes materiais biológicos (habitat natural) são mais estáveis e geralmente possuem o seu cofator disponível.
Obtenção do extrato bruto enzimático
Há diversos procedimentos descritos na literatura para obtenção de extratos brutos enzimáticos. O procedimento que vem sendo utilizado em nosso grupo de pesquisa é muito simples, rápido, eficiente e a atividade enzimática no extrato é mantida por longos períodos. Exemplificando, a seguir descrever-se-á o procedimento de obtenção do extrato bruto vegetal da abobrinha (Cucurbita pepo) como fonte da peroxidase. Após lavagem e secagem, 25 g do tecido vegetal descascado são picados e homogeneizados em um liquidificador com 100 mL de tampão fosfato 0,1 mol L-1 (pH 6,5), contendo 2,5 g de agente protetor (PVPs: polivinilpirrolidonas). Em seguida, o homogenato é filtrado em quatro camadas de gazes e centrifugado a 25000xg (18000 r.p.m.) durante 15 min, a 4 °C. A solução sobrenadante é dividida em diversas alíquotas (e.g. 10), armazenadas em refrigerador a 4 °C e usadas como fonte enzimática da peroxidase em diversos biossensores e/ou procedimentos enzimáticos de análise. Diversos outros extratos brutos como fonte de outras enzimas podem ser obtidos utilizando-se procedimentos similares30-39,41,43,44. Obtenção do tecido vegetal O tecido vegetal pode ser obtido na forma de uma fatia do material biológico descascado que é imobilizado na superfície de um eletrodo base potenciométrico, amperométrico entre outros. Outra possibilidade muito empregada consiste em se utilizar pedaços finamente divididos do material biológico vegetal previamente liofilizado e/ou desidratado. Em sistemas de análises por injeção em fluxo são muito empregados reatores contendo pedaços do material biológico vegetal30-32 ou mesmo o material biológico perfurado com o mesmo diâmetro dos tubos de extensão do sistema em fluxo. Nesses casos, a reação enzimática do alanito de interesse se processa na interface sólido-solução da amostra (ou solução de referência). Determinação da atividade e proteína total da enzima Como exemplo descrever-se-á o procedimento de determinação da atividade e proteína total da abobrinha como fonte da peroxidase. A atividade da peroxidase foi determinada medindo-se a variação de absorbância em 470 nm do tetraguaiacol formado na reação enzimática. Nessa determinação são usados 0,2 mL da solução sobrenadante (homogenato), 2,7 mL da solução de guaiacol 0,05 mol L-1 e 0,1 mL da solução de peróxido de hidrogênio 10,3 mmol L-1 em tampão fosfato 0,1 mol L-1 (pH 6,5), a 25 °C40. Uma unidade de atividade (unidades/mL) é definida como a quantidade de enzima que causa o aumento de 0,001 unidades de absorbância por minuto nas condições supramencionadas. Quando se conhece o valor da absortividade molar do analito ou de um dos produtos da reação enzimática é possível se determinar a atividade internacional (U). O teor de proteínas totais da solução sobrenadante, por sua vez, pode ser determinado pelo método do biureto51 ou de Lowry52, empregando-se albumina de soro bovino como padrão. No entanto, diversos outros procedimentos para quantificação de proteína total são usados. Entre eles destacam-se o “Coomassie brilliant blue” BG-250 ou reagente de Bradford53 e BCA ou reagente de Smith54. Recente artigo de divulgação desses procedimentos para determinação de proteínas totais, foi publicado por Zaia et al.55. Um estudo sistemático de obtenção de peroxidase de pêssego (Prunus persica), inhame (Alocasia macrorhiza), mandioca (Manihot utilissima), alcachofra (Cynara scolymus L.), batata doce (Ipomoea batatas L. Lam.), nabo (Brassica campestre ssp. rapifera), rabanete (Armoracia rusticana) e abobrinha (Cucurbita pepo) foi feito por nosso grupo de pesquisa40,42. A Tabela 1 apresenta a atividade (unidades/mL), proteína total (mg/mL) e atividade específica (unidades/mg de proteína) obtidos para diferentes extratos brutos vegetais. Como pode ser observado nessa tabela, o pêssego (Prunus persica) apresentou a menor atividade específica, enquanto a abobrinha a maior. Além dessas investigações, foram estudados os melhores procedimentos de obtenção de diversos extratos brutos enzimáticos, bem como o tempo de armazenamento a 4 °C.
FONTE: Orlando Fatibello-Filho* Departamento de Química, Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia, Universidade Federal de São Carlos, CP 676, 13560-970 São Carlos – SP *e-mail: bello@dq.ufscar.br Iolanda da Cruz Vieira Faculdade de Farmácia e Bioquímica, Universidade de Cuiabá, Av. Beira Rio, 3100, 78015-480 Cuiabá – MT Recebido em 22/3/01; aceito em 9/8/01